Por aqui entrámos recentemente no último trimestre de gravidez e algumas situações já me começaram a preparar para esta nova realidade que começará em breve: ser Mãe.
Hoje decidi trazer-vos quatro coisas que a gravidez já me ensinou sobre a maternidade, algumas pouco surpreendentes mas outras verdadeiras mudanças de perspetiva, e das quais espero não me esquecer no futuro.
Preparados?
- A Sensação de Culpa:
E se comer alguma coisa que lhe fez mal? E se os cremes que uso não estão indicados? E se me descuidei com uma lavagem das mãos e a serologia da toxoplasmose fica positiva? Todas estas questões nos passam mil vezes pela cabeça.
A sensação de culpa, a vulnerabilidade da vida que carregamos e a responsabilidade pela saúde e a segurança de um pequeno ser podem ser verdadeiramente esmagadoras se não tivermos cuidado com as nossas emoções.
- A Gravidez é quase uma competição:
Sabia que nós mulheres nem sempre somos solidárias umas com as outras mas no que diz respeito à gravidez e à maternidade as coisas podem ser levadas ao extremo.
Desde colegas que se queixam a outros quando pedimos ajuda para realizar uma tarefa mais pesada, àquelas que te tentam fazer sentir uma nódoa porque "eu nunca precisei de ajuda e não tive nem um dia de baixa" podes ouvir um bocadinho de tudo. Um conselho? Respeita o teu corpo, o teu ritmo e o teu bebé e sobretudo não te ponhas em risco para mostrar aos outros do que és capaz.
E depois a maioria das pessoas, inclusive homens e colegas sem filhos, são bastante mais solidários do que muitas "super mães" que se cruzam no nosso caminho.
- Os livros e sites sobre gravidez nem sempre são os melhores aliados:
Comecei a gravidez cheia de vontade de aprender mais e fiz imensas pesquisas sobre o assunto.
Existe informação muito boa mas também encontrei muita informação irrelevante, contraditória ou mesmo aterrorizante. E convenhamos que quando estamos perante um positivo, por muito desejado que ele tenha sido, já nos sentimos suficientemente em pânico.
Rapidamente percebi que a maioria dos livros e alguns blogs se dividem em dois grupos: os defensores da gravidez como o estado de graça último e aqueles que apresentam a gravidez e o parto como o Inferno na Terra.
Como nenhum destes pontos de vista me convinha e sempre acreditei que haveriam coisas muito boas e coisas muito difíceis, decidi parar de consumir este conteúdo e fiei-me às informações dos profissionais* que me seguiam, comecei a fazer confiança ao meu próprio instinto e a partilhar aquele medo e angustia com alguma amiga que já passou pela mesma situação e que teve provavelmente a mesma dúvida.
- O papel de Pai (e como pode ser difícil ser espetador):
Enquanto mulheres sentimos o nosso corpo mudar desde o início da gravidez e adaptamos-nos pouco a pouco à nova vida que se forma. Temos náuseas, vómitos e vimos o nosso corpo mudar pouquinho a pouquinho mas suficientemente rápido para nos adaptarmos a esta nova realidade.
Pelo contrário os pais tem uma posição de meros espetadores mas, ao mesmo tempo, é-lhes pedido que nos compreendam e que nos apoiem a toda a prova. O problema é que eles não conseguem sentir o que nós sentimos e esse desconhecimento pode ser assustador para eles.
Felizmente no nosso caso a comunicação funcionou perfeitamente e desde o início que conversamos sobre tudo e mais alguma coisa.
E essa discussão constante dos nossos medos, angústias e receios fez com que nos sentíssemos os dois mais seguros e confiantes à medida que a gravidez avançava. E depois a barriga a crescer, as ecografias e os primeiros movimentos que ele pode sentir acabaram por solidificar a sua posição de pai e começa a sentir-se "um verdadeiro jogador de futebol e não o treinador de bancada".
De notar que, apesar do meu marido ser o primeiro a reclamar quando numa sala de espera com dez mulheres existem apenas dois acompanhantes, a verdade é que os próprios serviços seja por falta de tempo ou por falta de hábito nem sempre lhes dão tempo de antena*. Ainda me lembro da primeira consulta na maternidade em que a sage-femme* mal olhou para ele ao longo de toda a consulta e nem lhe dirigiu palavra.
* Nunca é demais relembrar-vos, e para evitar alguns comentários como os que tive no post sobre o Body Positivy, os profissionais de saúde que nos seguem devem ser pessoas da nossa inteira confiança. Se não se sentem ouvidos ou se não acham que estejam a ser bem atendidos são livres de pedir uma mudança de médico ou uma segunda opinião. E sobretudo coloquem todas as dúvidas aos vossos médicos e não saiam de lá sem uma resposta satisfatória.
* A nossa realidade em Lyon é um bocadinho diferente da que me parece estar a acontecer em Portugal. Desde Maio do ano passado as restrições ao acompanhamento da grávida por um acompanhante adulto são autorizadas e até agora o meu marido pode acompanhar-me a rigorosamente todas as consultas, ecografias e mesmo numa ida às urgências ele foi autorizado a estar presente.
* Profissional de saúde com diploma universitário em França (e noutros países europeus como Reino Unido) que tem a competência do seguimento da gravidez normal (seguimento obstétrico, realização de ecografias, prescrição de exames complementares de diagnóstico), realização de parto normal sem presença obrigatória do obstetra, acompanhamento do pós-parto da mãe e do bebé nos primeiros dias de vida, aconselhamento em aleitamento, reeducação perineal e preparação para o parto e mais recentemente realização de vários atos de ginecologia em mulheres saudáveis. Em comparação com a realidade portuguesa será uma profissão que une as competências do obstetra-ginecologista (fora situação patológica) e dos enfermeiros especialistas em saúde materno-infantil. A reeducação pós-parto pode também ser realizado por um fisioterapeuta especializado em saúde da mulher sendo até mais indicado em caso de cesariana.
No primeiro Conversas entre Mulheres conhecemos um bocadinho mais da Rute do blog O Meu Maior Sonho que nos trouxe o seu testemunho sobre o como se manter motivada mesmo nesta fase difícil sem deixar de lado nenhum dos seus papéis.
Nesta segunda edição trago-vos o testemunho da Maria do blog Sorriso Incógnito.
A Maria é a típica "Mulher do Norte": carácter e força de vontade são duas características que sobressaem dos seus textos e é impossível não apreciar aquilo que nos diz e sobretudo a forma como o faz.
A cada uma das minhas perguntas ela respondeu com uma frontalidade incrível e ainda nos deixou uma mensagem de peso: "Não tenhas medo do espelho!".
Um testemunho muito, mas mesmo muito inspirante!
- Quem é a Maria? Fala-nos um bocadinho de ti e da mulher que és…
Costumo dizer que sou típica mulher do Norte. Acho que tenho um coração bom, sou de valores, tento sempre ser melhor pessoa, sou muito tu cá tu lá, sou a que se importa com o vizinho, mas tenho pimenta no nariz e o coração perto da boca. Prezo muito as relações entre pessoas, sou muito amiga do meu amigo (e se calhar o ter duas afilhadas filhas de amigos comprova isso), mas não sou fácil de abrir a minha vida a muitas pessoas.
Sou bem mais envergonhada que o que parece. Tenho sempre o melhor dos sorrisos, mesmo quando tenho todas as razões para chorar. Mas não sei lidar com a pergunta “passa-se alguma coisa contigo?”. É claro que quem me conhece às vezes consegue chegar lá. Sou uma mulher com orgulho de o ser, ciente dos meus defeitos mas consciente das minhas virtudes 😊
- Este último ano foi cheio de desafios para todos nós. Quais seriam os principais pontos positivos e as tuas maiores dificuldades ao longo dele?
Foi um ano diferente para todos, e sentido de forma diferente por todos. Eu fui uma privilegiada. Acho e admito, não poderia dizer o contrário. Estamos todos na mesma tempestade, mas é claro que em barcos diferentes.
O maior desafio para mim foi o teletrabalho que fiz pela primeira vez na vida, que de início até gostei mas que no balanço não foi assim tão bom. Mas a verdade é que o ponto positivo tive sempre trabalho. Sempre. E bastante. E continuo a ter. Graças a Deus. E consegui faze-lo em segurança junto dos meus e tendo também esse cuidado para com eles.
A minha maior dificuldade foram as saudades dos abraços e foi lidar com a saúde mental. Que deve ser do que ficou mais devastado este ano. Todos fomos afetados, mas quem já tem problemas agravaram. Eu tenho que lidar com isso, foi difícil. Muito difícil. Deu-me medo muitas vezes e continua a dar.
A minha saúde mental e a dos que me rodeiam é um ponto essencial para toda a positividade que tento ter no dia a dia e quando isso falha em algum ponto é deveras complicado.
- Como mulher fala-nos um bocadinho da tua organização com o trabalho, casa e todos os papéis que desempenhas (filha, esposa, amiga…). Sentes que consegues encontrar tempo para cuidar de ti ou nem por isso?
Confesso que sou um desastre no que toca a tomar conta de mim. Posso deitar desculpas para aqui ou para ali, mas na verdade não há desculpas porque quando quero mesmo as coisas arranjo todo o tempo quase sem falhar.
Tenho o típico trabalho 9 às 18h mas o horário nem sempre é literalmente esse muito menos quando a cabeça vem ocupada para casa. Tento que não aconteça para estar mais inteira com os meus, a casa e eu mesma.
Tento. Todos os dias são diferentes e acho que isso se deve ao teu humor diário. Se acordares bem vais conseguir lidar melhor com o tempo e com a sua organização.
Mas tenho pontos essenciais onde preciso que as coisas no trabalho me corram de feição para depois chegar a casa e organizar -me com o trabalho de casa a fazer, com ajudar os meus pais no que precisam, ter tempo para videochamadas para encurtar distâncias e no tentar falar sempre com algum amigo e nomeadamente a minha afilhada vizinha que me faz recuperar forças e desligar o stress dos dias.
Sou muito esponja e se conseguir ver à minha volta as coisas bem, eu estou bem e a cuidar de mim.
- Qual é aquele momento do teu dia em que te ofereces um bocadinho só para ti… e que se não o tens sentes uma falta terrível?
Não tenho um momento fixo, ou seja não posso dizer que é de manhã ou à noite ou quando chego do trabalho. Mas há um momento em que penso mais como está a minha vida, inevitavelmente quando vou a conduzir e quando me deito e estou completamente sozinha. Só para pensar mais em coisas minhas e alinhar chacras.
Há mulheres por exemplo que é quando se maquilham, ou quando fazem banhos spa, ou algo do género, não tenho paciência para isso, confesso. E nem é esse momento “típico zen” que me faz falta. Faz-me falta é cada momento que acho que falhei e não tentei ser melhor, de coração isso cutica-me no meu ponto essencial para me sentir bem.
Cada vez mais sou muito mais interior (à procura daquela paz) para ter harmonia com o meu exterior e o que transbordo.
- Uma das razões pelos quais adoro seguir o teu blog é o teu estilo e a tua forma de estar. Como fazes para manter a motivação na hora de levantar, vestir e arranjar e não sucumbir à tentação do pijama e fato de treino o dia inteiro e esqueceres-te de tratar de ti?
Confesso que nunca fui de ter um estilo. Sou sempre pelo que me apetece. Eu não consigo organizar a roupa para o dia a seguir por exemplo. Porque isso depende do meu estado de espírito. Tem dias que saio de casa arrastada por sapatilhas jeans e uma blusa básica. Tem dias que vai no salto porque me apetece e posso. Mas tem domingos por exemplo (mais inverno) que me apetece passar de pijama a passo. Não me sinto nada mal por isso.
Na verdade se estiver em casa gosto de estar o mais confortável possível porque me faz sentido assim como me faz sentido quando saio sentir-me bem nem que seja ir toda arranjadinha como quem vai para uma saída top quando vou só comprar pão.
Um dia destes tive uma "discussão " com alguém que me dizia que as pessoas se arranjam para os olhos das outras. Não digo que não tenha influência, mas eu arranjo-me para estar top aos meus olhos. E é isso que eu vou passar aos outros! Essa é a minha motivação.
- Qual o conselho que gostarias de deixar a todas as mulheres (e homens, claro) que precisam de um incentivo para cuidarem de si próprios ou que se passaram para segundo plano devido a todas as restrições e desafios que este último ano?
Não tenhas medo do espelho e enfrenta-o. O espelho não reflete quem és, mas é em frente a ele que te consegues ver melhor. Por fora e por dentro.
O dia a dia muitas vezes tira-nos isso e só olhamos de esguelha para um espelho, mas enfrentá-lo com a pergunta estás bem? Vai fazer com que se tente responder a essa pergunta e não é só se estás bem com essas rugas que começam a aparecer ou com os quilos a mais na balança é se estás bem com aquilo que o espelho te faz bem, se te gostas, se te sentes bem contigo mesma, se transpareces que estás bem.
Não tem a ver com as medidas, tem a ver com o teu EU. Isto é uma fase menos boa que vai passar e tu tens inevitavelmente que passar por ela mas temos que passar de cabeça erguida e a tentar acima de tudo que a nossa saúde mental acompanhe da melhor maneira.
E por aí, o que acharam deste testemunho da Maria? Eu confesso que retive a respiração ao longo do texto!
Para a semana teremos uma nova convidada que nos vai também ela trazer o seu testemunho.
Um grande beijinho e até ao próximo post!
Se ainda não seguem a Maria podem fazê-lo através do blog Sorriso Incógnito ou da sua página de Instagram.
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