O Natal dos Hospitais
Post n.º 21 do Calendário do Advento da Nala
Li muito a frase "este Natal não teremos Natal para podermos ter para o ano" e não pude deixar de fazer toda uma reflexão com ela.
Se é verdade que, se as coisas fossem lineares, isso seria realidade. Por outro, e talvez seja o meu lado mais realista a vir ao de cima, não será bem assim.
A única coisa que está nas nossas mãos é a escolha atual: o que fazer neste Natal. Nada nos garante que estaremos todos à mesa de Natal no próximo ano.
A vida é demasiado imprevísivel para apostarmos tão alto.
Hoje gostaria de trazer à nossa memória aqueles que passarão o Natal sozinhos para ficarem "protegidos", alguns sem terem sido ditos nem achados nesta decisão que cabe aos filhos.
Gostaria de deixar uma palavra de apreço aos pacientes que passarão esta Noite Santa numa cama de hospital ou sozinhos num lar de terceira idade. Aos que estão na rua à chuva e ao frio. Que quem estiver escalado nesta noite terá a dificíl missão de escutar e dizer uma palavra de conforto pela solidão que estão a sentir.
Quantos desses estarão lá no próximo ano de boa saúde para poderem aproveitar. 2020 fez-nos esquecer duas coisas fundamentais: não é só o COVID que mata (antes fosse que era muito bom sinal, desculpem lá a franqueza) e que um ano é muito tempo!
Todos os anos, e sempre que trabalho na véspera de Natal, saiu do hospital com a sensação de "dupla pena" que muitas daquelas pessoas sentirão. Estarem sozinhas e fragilizadas quando deveriam estar rodeadas pelos filhos e os netos. E algumas ainda têm a gentileza e metem o pouco que têm num sorriso e num "Boas Festas" dito em jeito de despedida.
Não é de agora mas é ainda mais fundamental falar-se nisso neste ano. Se queremos falar de saúde e segurança que as possamos olhar pelos diversos angulos e nem todos são tão luzidios como aqueles que insistimos em ver!
E a incerteza do futuro é ainda mais flagrante nestes sítios. Aliás, posso agradecer à minha profissão e a tudo o que ela me fez sentir e ver o tanto que aprendi sobre desespero, tristeza e solidão. E daí ter opiniões tão marcadas e tão contrárias à maioria que simplesmente levantam os ombros e dizem "para o ano há mais". (E Deus sabe como lhe agradeço quando são os primeiros a sairem-se com essa frase, mesmo que isso me dê cabo dos nervos).
Porque o nosso tempo é finito e escasso e "adiar" os afetos e os abraços não é a mesma coisa que "adiar" a compra do novo sofá da sala. Nada nos garante que haverá amanhã para os nossos idosos, os nossos familiares doentes ou mesmo para nós, por muito saudáveis que sejamos. Quantas vezes a vida já nos provou que se "apaga" em menos de nada?
Que com restrições ou gestos barreira não esqueçamos que o ser humano precisa de afeto e não de uma "gaiola dourada" como aquela onde tantos idosos estão a viver com a "desculpa perfeita" de uma epidemia mundial.
E porque um ano é muito mais tempo do que aquilo que parece e uma vida precisa de apenas um minuto para acabar ou para dar uma volta para melhor.
Por isso passemos o Natal em segurança, com respeito dos gestos barreira, com máscaras, álcool-gel e o que quer que seja mas não "esqueçamos" que este Natal pode ser mesmo o último... e que há muito mais doenças do que aquela de que tanto se fala e que a solidão, mesmo que seja a zona menos arriscada, é tão mortal como o resto!
Não te esqueças de acompanhar as Crónicas da Cidade dos Leões no Instagram e no Facebook: há muita coisa a acontecer por lá.
Se por acaso o conteúdo deste texto te agradar não deixes de o partilhar com familiares e amigos.